7 de jun. de 2009

do peito do pé dum palco

atirei o pedro no palco
mesmo com o pé não preto
atirei o pedro
retirei o choro
coloquei o público
e atirei o pé do pedro no palco

só riram os que sorriram
choraram os que não viram
morreram os que viviam
beijavam e devaneciam

do pé do pedro veio o devaneio
devaneou-se devaneou devanei
o
bem do peito do pé dum palco

30 de abr. de 2009

O Inocente

Foi num domingo de abril, quando o namorado de K... estava brincando com o Inocente, no corredor do apartamento e viu uma imagem de Jesus Cristo, em cima de uma mesinha com outros adornos e santos católicos.

O namorado de K... olhou para o Inocente, parou no corredor, segurando o garotinho pelo braço, suavemente, e quase que sussurrando, com ar de mistério, daqueles que prendem a atenção das crianças falava “... o que te falam sobre Jesus é lenda: apenas uma história; existem muitas pessoas que não acreditam em Jesus. Quando essas pessoas rezam elas não fazem o sinal da cruz e suas orações são destinadas a vários deuses diferentes” e olhando mais uma vez para o menininho confessou “eu mesmo, não acredito em Jesus nem em Deus e acho que as pessoas que vivem sem acreditar em nenhum deles vivem bem melhor”. O namorado de K... sabia prender a atenção do garoto, a magia entre eles era forte, e o mais velho, que admirava muito cada sorriso do Inocente, estendeu essas palavras de forma cada vez mais cativante para o menino. Percebia-se, se alguém tivesse os visto e ouvido sem interromper, que as palavras do namorado de K... eram com a intenção de informar o Inocente, assim como também fazia a respeito dos astros do rock and roll e de tantos outros assuntos.

O Inocente se divertia na companhia do namorado de K..., e isso o agradava de uma forma que nem sabia explicar às pessoas, sentia-se mais livre para falar o que quisesse e mesmo que pedido um silencio ou outro, ele falava.

Certo dia o Inocente ao passar pelo corredor onde tinha a mesinha e a imagem, deu meia volta e chamou B..., a mãe de K..., e contou o que namorado da filha da senhora havia dito à ele dias antes. A mulher ficou indignada com que o genro havia dito ao Inocente; sentiu que já não era possível tirar da cabeça do menino que outras pessoas tinham outras crenças, mas havia ainda de falar que deus existe e que ele deve orar a Jesus para conseguir boas coisas. Ficou ansiosa para ver o genro, era de se esperar que a sua doce rispidez e seu orgulho queriam uma explicação. Havia dois dias que o namorado de K... não aparecia por lá, o que levava B... a julgar que nesse dia apareceria ou, no mais tardar, no dia seguinte pela noite.

Dito e feito, às sete em ponto do dia seguinte o genro de B... estava tocando a capainha.

— Oi Amor — disse K..., sempre de sorriso meigo, abrindo a porta.

— Buhh! Vem cá pra você ver as coisas que eu montei — já gritava o Inocente puxando o namorado de K... pelo braço.

O genro com a namorada, entrando pela casa encontraram B..., que tinha feito bolo de fubá com café. B... era sempre hospitaleira com o genro, mesmo estando ainda zangada com aquelas coisas que ele tinha dito. E logo que entraram na cozinha a mulher lembrou de tudo que o neto tinha contado.

— Nossa, pega um café aqui. Põe a xícara aí pra ele filha. Tem pão também, aceita?

— Não, obrigado. Já estou até bem farto, comi após o trabalho. Claro, não negarei o cafezinho — dizia o namorado de K..., que também não era bobo, queria comer, mas aproveitava a situação para sempre fazer a sua média.

— O Inocente me disse que você falou algumas coisas de religião e sobre Deus ... essas crenças do povo ... essas coisas de existir e não existir.

— Ah, é! Falei pra ele algumas das coisas que eu penso e algumas que outras pessoas pensam. Acho necessário ...

— Religião cada um tem a sua ... seu “tipo” — interrompia-o B..., censurando o que diria.

— Não — continuava o genro, que conquistara o direito de voltar a falar com um olhar sorridente e minaz... é que eu ... eu acho necessário que as crianças sejam educadas com estimulação do conhecer, da investigação infantil. A criança que aprende a perguntar e tem respostas, sempre com as palavras medidas para a sua idade, aprende melhor a conhecer o mundo, são vários assuntos na cabecinha delas.

—Então vamos comer e deixar esse assunto pra lá — intervia K..., para que os discursos não se alongassem e acabassem perdendo o bom senso.

O genro se serviu do café e acabou por pegar um pedaço de pão com manteiga que a namorada já havia preparado.

— Mas tem coisas, como... essas... de religião, que eu acho que cada casa deve ter a sua e deve ser mantido o respeito — ainda falava a sogra.

— B..., a Senhora está dizendo que é pra eu não falar mais disso com o Inocente?

— É isso sim, não quero que ninguém intervenha na educação que eu dou ao meu neto.

K... olhava para o namorado com olhos de censura, querendo naquela face expressar que ele deveria calar-se e, mesmo ela se importando e conhecendo o pensamento dele, aceitar o que a sogra dizia-lhe.

— Não aceito me proibir desse tipo de assunto com o Inocente — começou novamente o namorado de K... —, isso é falta de respeito ... repressão às visões diferentes; ao conhecimento.

K... tentou interromper novamente, mas ele decidiu que ia ali despejar muita coisa. Para um observador como era, ver o pensamento daquela família enraizada em preconceitos e conceitos fariseus era um fardo que decidira aliviar de suas costas, ali, naquele momento.

— Eu só quero então falar uma coisa — começou, dando um gole do café, e prosseguiu educado e levemente sarcástico — ... tenho poucos anos, mas não acho que isso seja motivo para não poder falar para uma pessoa que sabe ouvir, mesmo sendo mais velha e minha gentil (sem ironia nessa parte, juro!) sogra, que eu sou ateu e creio que a vida sem busca espiritual e religiosa pode conter muito mais paraísos que a eternidade após a morte; vivo para o presente, não só pra ficar com frasezinha Carpe Diem, sim para descobrir os mistérios de todas as partes da Natureza e do Mundo, dos sentimentos, de como o homem ama, odeia; em “como?” e “porquê ?”, nessas perguntas, consiste a maravilha do Mundo, ela é a ponte para o Paraíso. Eu ouço queixa de muitas pessoas sobre o tédio, mas eu ouço também poucas histórias de pessoas que tem coragem de quebrá-lo, mas até aí é uma questão pessoal. Quero retomar meu ponto no assunto dizendo que se fixar em um dogma religioso é uma forma de entrar para o tédio mortal, dos piores... é aquele que você escolhe estar nele, inerte, entregando suas horas, suas opiniões e gostos aos mandamentos de um criador que já foi mais que refutado, ainda mais quando se pensa em ética ... ou ... a Senhora esqueceu que escravidão é quando as pessoas trabalham sem salário, com fome e sujeitas a penitências? O que isso tem haver com o assunto?

Tomou um ar e sentiu-se orgulhoso por falar firme e com ternura.

— Pois tem, tem tudo haver ... não são os padres que trabalham nessas condições, não são os eclesiásticos, mas sim os seus fies. Que por serem e para serem fies à doutrina e tradição do evitar o pecado, acabaram fies a esses charlatões e, cada vez mais, desleais a si mesmos, aos seus desejos e seus corpos. Vou além nisso, levo ainda ao pessoal — nesse momento todos na cozinha estavam já de olhos esbugalhados, ainda mais com essa última frase —, não consigo entender como uma mulher tão inteligente consegue deixar a filha dormir na casa do namorado mas esconde isso de todo o mundo, envergonhada de ousar ir contra a moral da sua religião... mas sinceramente eu sei... a Senhora foi educada na moral cristã, aprendeu que não pode pecar, mas peca; o fato é que sua religião permite o pecar e é o seu pecado que te faz ser cada dia mais religiosa. É um círculo sustentado pela imagem do padre que não te deixa pecar, mas caso peques, precisarás apenas de umas rezas para que tudo fique bem. A Senhora então reza, paga ainda um dízimo, o seu “obrigado por aceitar minha imundície”, acredita estar limpa e agradece por isso! Mas o que eu queria falar para o Inocente é que ele não precisa ser tão sujo quanto todo esse rebanho. Ele pode sorrir e orgulhar-se de sorrir, pode ter sentimentos nobres, pode saber por meio de estudos e carisma como lidar com as pessoas, pode crer que a morte é apenas a continuação da vida sem ele, e pode até depositar fé na morte, pois o corpo nutre a terra que nutre a vida que um dia morre ... e que quando ele nasceu ele não era culpado de nada, aliás era o mais puro possível.

Foi uma cena nunca vista naquela casa, nenhum deles tinham percebido o pequeno vulto na porta. O Inocente segurava um portarretrato com uma foto do seu batizado. Estava com os olhos alagados. Todos se assustaram, mas as frases haviam ecoado até o quarto do pequeno, não distante dali e ele viera ver. Assistira todas as frases finais. Dentro daquela cabecinha tinha um sentimento de vida, de querer viver. Correu para o rumo do namorado de K... e abraçou-o pela cintura, o mais alto que alcançara. Olhou para a avó com um pequeno medo, um sentimento de ansiedade pelo o mistério do momento que estava a vir, esperava ela dizer algo, mas ele se antecipou.

— Desculpa vovó, mas eu quero ser o Super-Herói.

25 de abr. de 2009

#07

não sou bom com talher chique,
mesa limpa e prato raso.
ao sentar anseio o descansaço.

levanto correndo e apressado,
nem ligo se a banda não vai passar.
camisa gola polo e furo de cigarro.

26 de mar. de 2009

Chífitidél

sem tato sem teto sem kebe
sem sim sem não sem sinto
sem cinto sem calça descalço
sem olho, caolho tesouro

sem mim sem ti sem hífen
ontem foi sem e hoje também
sem tom sem com sem som
ontem foi também hoje é nem

sem isso aquilo sempre sem
um gole na água de quem?
sem delete insert com senha
sem me serve sem atena

tv sem cabo não rola
sem ver o mundo lá fora
não sei se sou quem
nem é de mim falar o amém

1 de fev. de 2009

Eu tenho pensado nisso:

Ontem foi seu aniversáro, masquem ganhou o presente foi eu. Naquele bar, naquela mesa de aparência tão trivial para nós - das quatro cadeiras: duas vazias nos agradam. Chuva fina dispersando nossas intenções, mas mesmo assim pedimos a bebida e o aperitivo que gostamos. Foi no meio das nossas conversas sobre futuro, casa e paladar que fiquei então sabendo dos possíveis planos de sua mudança. Justo agora que mais aprendemos a lidar com as regras da maturidade, você diz que não mudará e que comigo quer ficar. Justo quando agimos mais racionalmente? Só pude mesmo me aquietar e dizer, no meu jeito comum mesmo: "pode contar comigo, aqui ou lá, pode contar".